sexta-feira, 5 de julho de 2019

Sobre a morte...

Todos aqueles que vivem em Belo Horizonte e já andaram pelas imediações da Avenida Silva Lobo, até a Via Expressa, já viram um rapaz, provavelmente jovem, sem pernas e muito sujo, utilizando como meio de transporte um Skate. Próximo a algum sinal de trânsito, ele segue na lida do dia a dia.

Sempre o observei. Inicialmente com pena, mas, com o tempo, com certa admiração.

Às vezes penso nas políticas públicas e sociais, nas pessoas sem moradia, sem alimento, sem educação, saúde… Na hipocrisia religiosa e pseudo-solidariedade implantada na mente das pessoas conduzidas pelo espelho da vaidade e do poder. Da incompreenção das necessidades básicas do ser humano, símbolo de um mundo fracassado. Da ilusão implantada em nossa mente, de vivermos tempos modernos, onde nos comunicamos com o mundo todo, a qualquer momento, favorecendo assim, nossos dias. Stop, please…

Para que me serve essa comunicação se o que predomina são asneiras nas redes sociais e nos órgãos de imprensa? Se o pecar por “Falso testemunho” (assim chamo o que denominam “Fake News”) inunda as atitudes de pessoas aparentemente de bem que, sem escrúpulos, assumem uma postura antiética frente à sociedade? Se a necessidade de suplantar a opinião alheia tornou-se mais importante que a essência do ser e o respeito à diversidade?

Refugiando-me na música e na literatura, principalmente, sempre consigo me preservar,  afastando esse ódio espalhado pelo sistema que mata, aos poucos, a nossa sensibilidade e percepção de um mundo que acontece “lá fora”. Trazendo para dentro de mim a responsabilidade da boa convivência com todos aqueles que me cercam e dividem comigo esse mundo. Aceitando as diferenças.

Matar sempre foi considerado algo repulsivo, inaceitável. Símbolo da perda da razão. “A vida, a Deus pertence” foi o que sempre ouví. Nos tempos atuais, talvez, a deus pertença. Se continuarmos matando, por ideologia, a liberdade de sentir, querer, ter opinião, crer, buscando nessa atitude um modo de preencher os dias, estaremos fadados à destruição de nosso maior bem: a capacidade de experimentar, observar e mudar nossas atitudes. Tendo como base a ética e o respeito a todos os seres vivos e à natureza.

Estamos trilhando um caminho inverso e dando suporte e veracidade às palavras atribuídas a Leonardo da Vinci, lidas em um velho livro biográfico e, aqui, traduzidas livremente: “A inteligência que foi dada ao homem, é um bem incomparável. E, no entanto, muitos homens nada mais podem ser chamados do que trânsito de alimento e produtores de esterco. Porque deles no mundo, nada mais que privadas cheias, permanece.”

O sinal fecha e, frente à ansiedade daqueles que projetam em sua pressa o ronco dos motores, nada mais resta àquele ser, sobre as rodas de um skate, que levantar os braços. Um companheiro de rua, maltrapilho, sujo e, aos nossos olhos, repugnante, entra em cena e lhe dá as mãos,  arrastando-o em formidável espetáculo digno de uma “largada” de fórmula 1.

Solidariedade lá fora…

“Um dia ainda entra em desuso matar gente”. (João Guimarães Rosa - Grande Sertão - Veredas)

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