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Sonhos graciosos - Encontros

O acaso nos leva para onde quer e como quer... De repente nos deparamos com algo inesperado. Detalhes sutis que nos arrastam para outros pensamentos, que nos conduzem às conclusões sobre a vida que, às vezes difícil, nos remete ao sonho como única saída e possibilidade para aceitar a realidade. Nem sempre como gostaríamos. Apenas aquela possível. Olhava as luzes de um restaurante em frente, imaginando quantos assuntos e pensamentos diferentes, simultaneamente, tentavam, naquele instante,  se fazer entender. As pessoas gesticulando e falando alto. Somente se ouvia um som indefinido de muitas falas. Na rua, carros passando e contribuindo. Reforçando o som do mundo. O som do mundo experimentado nas grandes cidades. Em minha mesa a fala era mansa, em volume adequado às conversas tranquilas, revigorante por sua natureza espontânea e descompromissada. À minha frente duas luzes suaves iluminando a noite que chegava com o frescor de um hálito que contrariava o calor da tarde. Tudo era inusi

Ciranda

Pensei nos chamados “Parques de diversão”, de minha infância. Simples, empoeirados… Mas que me deixavam empolgado e feliz com suas “canoinhas”, principalmente. Cordinhas puxadas em sentido contrário e duas crianças se auxiliando com toda a força dos braços, para alçar grandes voos. Havia também um cheiro de pipoca e uma música que minha memória não quis guardar. Esqueceu.  Veio-me também à memória, a lembrança do palhaço nos circos. Verdadeiro artista, esse sempre foi o meu ídolo. Ficava sempre curioso para conhecer o rosto por trás da pintura e durante muitos anos alimentei em minha alma infantil a possibilidade de ser como ele. Um dia, junto com meu filho, aventurei-me nessa jornada. Rompi as amarras e encarei o que, depois, entendi ser o melhor momento de minha vida. É que meu companheiro de travessuras acreditava piamente na veracidade desse sonhador e me deu o suporte necessário para a conquista máxima da vida. O desprendimento e a liberdade de ser o que se é naturalmente. C

Respostas...

Assistindo a um filme*, resolvi escrever sobre uma frase intrigante, do protagonista: “Só há quatro perguntas de valor na vida”. O que é sagrado? Embora vivamos presos a conceitos e preceitos, principalmente religiosos, transmitidos por nossos antepassados, quando nos abrimos para a vida aceitando os desafios com um olhar imparcial e desprovido de preconceito, nos deparamos com nosso Eu verdadeiro. Onde reside a verdade, segundo Santo Agostinho. Não a que mostramos no dia a dia para aqueles que convivem conosco, mas aquela que trazemos guardada no íntimo, onde convivem certezas e inseguranças. Onde nem sempre somos como aparentamos ou desejamos aparentar. Nessa investida, pouco a pouco, abandonamos o nosso eu periférico, aquele que é conhecido e esperado por todos. Esse sentimento puro nos conduz ao respeito profundo e natural por todos os seres e nos enleva e eleva  ao estado de consciência alterada. Tornando nossa jornada nesse mundo, um caminho de aprendizado. Não sabemos para o

Quantas vidas...

Após assistir “Balzac e a costureirinha chinesa”, pesquisando sobre o filme me deparei com essa frase atribuída a Honoré de Balzac: “É tão absurdo dizer que um homem não pode amar a mesma mulher toda a vida, quanto dizer que um violinista precisa de diversos violinos para tocar a mesma música.”  Não sei o contexto em que foi escrita, mas, machismo à parte (ambos podem amar, ou tentar, por toda a vida), gostei da frase.  Pensei nas várias formas de amor e na possibilidade de uma vida bem vivida, seguindo fielmente nossos ideais amparados pelo respeito a todos que encontramos, sem a necessidade de muitos argumentos corroborando nossas atitudes. Alguns dando muitas voltas e outros caminhando em linha reta. Porém, todos com o mesmo objetivo…  Nesse eu quero crer: viver em paz experimentando cada momento, saboreando as coisas boas e aceitando as dificuldades com a cabeça erguida. Com honestidade, resignação e determinação. Respeito e espontaneidade exercitados no dia a dia, nos liberta

Um dia de canção

Parte A Chegar à sede da UBC no Rio de Janeiro nessa última sexta-feira foi interessante. Triste, talvez. Logo na recepção, pude ver um banner que anunciava a morte de Fernando Brant. A recepcionista, Soninha, com olhos tristes me saudou com um beijo suave e um abraço indagador. Daqueles que nos questionam a falta do protagonista. Eu, coadjuvante, diante de um semblante de choro, decidi que iria subir para ver algumas pessoas. No elevador, era como se desvendasse diante de mim uma nova casa em um silêncio total que dominava minha mente, entremeada por pequenos cumprimentos aos funcionários que cruzavam comigo que, com olhares suaves, assentindo com a cabeça, confirmavam entender minha solidão. Foi no oitavo andar, após o sorriso comedido e tímido das meninas que me receberam, que me dei conta do vazio que vivemos quando pessoas que amamos e respeitamos, se ausentam de nossas vidas. Marisa Gandelman com os olhos marejados, veio me receber e num abraço longo dissemos tudo que nunca pod

Arte e vida em sociedade

Noite sem sono. Na madrugada os problemas ganham outra dimensão. Tornam-se maiores. Enquanto o pensamento briga com o corpo inquieto, penso em nossa condição atual. Na arte, na vida... Como em minha mente eu posso questionar tudo sem ser censurado, imagino o quanto nosso país é inculto. Na acepção dessa palavra, mal cuidado. Nos últimos meses, quanta vergonha tenho sentido em reuniões com autores estrangeiros, quando abordam o caráter e a honestidade dos políticos brasileiros. Eu, sempre argumentando e questionando todos pela ótica  da legitimidade da correção pessoal. Da dignidade individual. Da índole. O que mais me atemoriza em todos esses aspectos medonhos que vivemos, é a hipocrisia. Também e principalmente, da sociedade. Das organizações e grupos que promovem o conservadorismo e, ao mesmo tempo, não se assustam com a massificação que assola o país por meio do condicionamento de ideias, tendências e exposição de uma pseudo realidade. Onde o ter, em todos os níveis, se impõe a

Sobre amigos e quintais

O limite territorial era pequeno. Embora fosse de um quarteirão a outro, podia-se avistar com facilidade o eventual trânsito de automóveis na rua de baixo, quando se escalava um pequeno muro que separava o jardim, da chamada rua do meio. Existiam apenas três ruas, conhecidas como a de cima, a do meio e a de baixo. Meu universo se restringia àquele quintal oculto por uma casa velha situada na rua do meio, que tinha à sua direita lindas flores que cresciam a esmo num jardim forjado pelas mãos da natureza sem nenhuma interferência humana. Ali, pelas mãos do criador, segundo critérios naturais, nasciam e morriam flores do campo, marias-sem-vergonha, rosas, margaridas, antúrios e um desavisado canteiro de cebolinha verde que brotava e, num curto espaço de tempo, sucumbia à força de imensas samambaias e ervas daninhas. Naquele tempo, eu, aventureiro, desbravava uma grande floresta com seus perigos, levando no peito aberto um sentimento talvez experimentado apenas pelos primeiros bandeira

A solidão da existência em Hermann Hesse

A evolução pessoal e espiritual por meio da experiência estética vivenciada  na arte é constante na obra de Hermann Hesse, escritor alemão, nascido em Calw e naturalizado suíço. Desde suas primeiras obras até a maturidade plena, quando produziu seus grandes romances, seus personagens, quase sempre espelhos de sua realidade, encontram na música e na pintura, principalmente, o impulso criador como mola propulsora para o enfrentamento da realidade e contingências do dia a dia. Em um paralelo entre a vida vivida intensamente, em meio às suas complexidades, a evolução rumo ao conhecimento por meio da experiência diária e o embate com a fragilidade do ser, confrontando com as regras de comportamento e luta pela sobrevivência, vemos o nascer de um outro componente: o homem enquanto individuo pensante, com suas necessidades, qualidades e desejos de auto afirmação, na solidão de sua existência. Hesse, como Nietzche, considerava a música uma arte feminina, que se organiza por meio de harmonia

Cinema

Voar tornou-se símbolo de liberdade. Da busca do desprendimento das amarras da vida. Mas é na solidão de uma cela, morada de um condenado à prisão perpétua, que um filhote de pardal encontrará o cuidado necessário para crescer longe de seu ninho, longe de sua espécie, dando início a um período de paz interior, justamente quando o detento se envolve e se preocupa com o dia a dia dessa ave solitária. Isso dá sequência a uma história fantástica sobre o cuidado e a leveza, necessários para lidar com pássaros tão frágeis e delicados.  Sentimentos que contagiam o coração. Ali, onde o termo “liberdade” não produz os efeitos práticos, resta somente a libertação da alma. A aceitação das limitações da vida vivida em cativeiro. Justamente com pássaros. Estou falando do filme “Birdman of Alcatraz”.* Não sabemos o que nos espera após a morte... Moldamos, ao longo da vida, o que pensamos ser o melhor e, baseados nos preceitos familiares e na convivência social, fazemos opções assumindo as consequê

Todas as manhãs do mundo

Música... Teremos que fechar os ouvidos para tudo que nos propõem. Teremos que abrir nosso coração para tudo que desconhecemos. Quem sabe nos encontremos na entrega, no voo maior da busca? Por que ser músico? Por que compor ou estudar um instrumento? Quando podemos considerar o que fazemos, como música verdadeira? Muitos artistas já se perguntaram ou se depararam com esse questionamento, que definiria sua permanência, ou não, nesse difícil caminho. Baseado no livro de Pascal Quignard - Tous les matines du monde -  “Todas as manhãs do mundo” (1991), de Alain Corneau, é um filme com um roteiro sutil, com uma aura bucólica e um romantismo comedido na aparência, embora intenso na essência. Caracterizando um conceito e estilo de amor trágico que, mesmo com a utilização de elipses, não transparece nenhuma preocupação com as entrelinhas. Permitindo que os personagens vivenciem a lentidão e a solidão do tempo interior. Sainte-Colombe, um grande músico afastado da corte, vive com suas dua